Desde
1910 até ao Final da 2ª Guerra Mundial (1945)
Todo o discurso do capítulo anterior é bem
representativo do grau de exigência com que os portugueses se viram
confrontados pelos seus compromissos internacionais e pela exigência do seu
novo papel e a forma como os zombo entenderam
algumas ambiguidades e o novo conflito, que não esperavam e com o qual
começavam a confrontar-se. Tratava-se do início daquilo a que se veio entender
como – o Fenómeno Colonial. Como
temos vindo a perceber, os zombo faziam parte duma “elite tradicional” que, ao
longo dos séculos, através de um quase monopólio do comércio de caravanas de
longo curso, continuaria a dificultar a concretização desse mesmo Fenómeno Colonial. Podemos socorrer-nos
das palavras do professor A. Silva Rego para definirmos este conceito: “ É o fenómeno pelo qual uma
nação, ou mesmo, um grupo étnico se estabelece em regiões, geralmente situadas além-mar,
habitadas por povos de civilização diferente ou inferior”.
Este fenómeno, com
efeito, tornou-se numa complexa questão no decorrer dos últimos cinquenta anos
do século XX. Quem investiga, em termos académicos, o tema, sujeita-se às
consequentes críticas vindas de todos os quadrantes políticos, sociais e
económicos, face à forma como reveste o seu discurso. Assim, devemos deixar
claro que a fase da colonização, sobre a qual nos debruçaremos é a da colonização
moderna, ou seja, aquela que resultou da Convenção
de Berlim de 1884/1885.
Os colonizadores, a partir de então, eliminarão os
poderes das organizações políticas tradicionais da população local. A
consequência foi o início da Paz Colonial
iniciando-se, assim, o ‘caminho’ da adaptação ao meio da nova e inexperiente administração
civil, e com ela se faria lentamente o reagrupamento das populações. Por volta
de 1906, apareceu a obrigação do imposto indígena – base política da autoridade
portuguesa – cujo pagamento era obrigatório a todos os colonizados válidos. A
sua aplicação e receita foram excepcionalmente importantes. Efectivamente, os
homens considerados válidos tinham de se dedicar a um trabalho produtivo, caso
contrário, deveriam empregar-se junto das autoridades locais. Entre os autores
que se dedicaram, no terreno, ao assunto das ‘Questões Coloniais’, ressalta a
autoridade de Lopo Vaz de Sampayo e Mello (1910:421) com a obra Política Indígena na qual afirma:
“Quando aconteça estarem os autóctones isentos de qualquer imposto antes do estabelecimento da autoridade dos colonizadores, é indispensável que a tributação que se lançar seja moderada, e que na sua cobrança se observe a mais evangélica paciência, contemporizando-se sempre que possível for, com as reclamações dos interessados. Por se terem mostrado intolerantes e exigentes os seus agentes fiscais tiveram os ingleses que sufocar penosamente sucessivas revoltas que o lançamento do imposto de palhota provocou na Serra Leoa e na Achantalandia. Há toda a vantagem em conservar o sistema de cobrança de impostos utilizado pelos indígenas, e, até em certos casos é conveniente continuar aproveitando os serviços dos primitivos recebedores.”
Apesar
de todas estas cautelas por parte dos responsáveis da política indígena, muitos
abusos aconteceriam, ao longo do processo da aplicação dos impostos, como já
tivemos ocasião de observar. O ‘imposto de palhota’ (como é chamado por Lopo Vaz
de Sampayo e Mello, na página 428, da obra citada “Nas outras regiões africanas sujeitas ao domínio portuguez, o imposto
indígena, ou é um mero tributo annual de vassalagem pago pelos chefes naturaes,
ou imposto de palhota que é uma espécie de contribuição predial fixa.”) com
a designação de imposto de cubata, segundo o autor supracitado (1910:443) “foi criado pelo decreto de 31 de Maio de
1887, referendado por Barros Gomes, que fixou o seu quantitativo em 250 reis
anuais por cada cubata”. Recordemo-nos dos problemas que a administração
portuguesa teve com o grande chefe Buta
até 1915 e por aí, podemos avaliar a dificuldade do recebimento do imposto. Na
secção que dedicamos à 2ª Companhia Militar de Maquela do Zombo, daremos
conta novamente dessas mesmas dificuldades.
A vida
dos colonos que vamos abordar, pouco ou nada se relaciona com aqueles a que os
naturais do sul de Angola apelidaram de xicoronho,
e que foram a base do pensamento de Norton de Matos, alto comissário de
Angola, na sua segunda governação (1921/1923). Vinha investido naquele primeiro
cargo com mais amplos poderes governativos da colónia, após ter desempenhado as
funções de ministro das colónias e de ministro da guerra. Nessa altura, foi feito, ao nível das possibilidades da
administração portuguesa, um grande esforço para incrementar a colonização dos brancos
em Angola. Neto (1964:115) na sua dissertação de doutoramento Meio Século de Integração e, mais
precisamente, na secção de título ‘A Acção do alto comissário Norton de Matos’
logo no início afirma o seguinte:
“A Acção de Norton de Matos, como Alto Comissário, no sector
de povoamento europeu, fez-se sentir mesmo antes da sua chegada à província,
porque tendo comunicado em Novembro de 1920 para Angola que no próximo mês de
Janeiro chegariam com destino a Porto Alexandre 60 pescadores «poveiros» o encarregado
do Governo Geral determinou por portaria a abertura de um crédito de 80.000$00
para instalação da colónia poveira e da indústria de pesca a que ia dedicar-se.
Esse núcleo de poveiros devia de
constituir, segundo as intenções de Norton, um primeiro passo para o
estabelecimento, ao longo da costa e durante um período de 10 anos, de vinte
povoações de pescadores metropolitanos em todos os pontos onde fosse possível
encontrar água potável e que não estivessem já ocupados por povoações
importantes, de modo que, para futuro, não se percorresse um grau de latitude
com o mar à vista sem se encontrarem pelo menos, dois estabelecimentos
constituídos por famílias metropolitanas: cidades, vilas aldeias ou simples
grupos de pescadores.”
Pela descrição do autor citado, e pelo que já foi referido,
vemos que o centro e sul de Angola, em nada se comparavam com a realidade do norte
de Angola, (o que ainda hoje acontece apesar da independência), se
considerarmos norte, a linha que começa com a zona dos Dembos, a cinquenta quilómetros de Luanda,
sensivelmente a partir da povoação do Sassa
contígua à fazenda da ‘Tentativa’ produtora da monocultura de cana de
açúcar localizada no Caxito. Ali, começava o profundo isolamento, só quebrados
cento e vinte quilómetros mais além, na vila do Ambriz. Depois, de cerca de
trezentos e cinquenta quilómetros, outro aglomerado populacional se nos
deparava a vila do Bembe, com pouco mais de uma escassa meia centena de
europeus incluídos os funcionários públicos.
Nesses
tempos, quantas colunas de camionistas (considerando mais ou menos quatro ou
cinco camionistas por coluna) juntavam-se para se entre ajudarem a passar os
enormes lamaçais provocados pelas chuvas torrenciais. Iam sempre preparados com
tábuas (que colocavam debaixo do chassis da viatura) para passarem os areais à
custa do trabalho com enxadas, pás e catanas, para cortar troncos com que
chegavam a fazer pequenos troços de estrada, por vezes com mais de cinquenta
metros. Frequentemente, descarregavam metade da carga, voltando a carregá-la,
após a passagem dos ditos lamaçais. Passavam-se dias e dias a fio, a comer atum
enlatado, chouriço rançoso e batata-doce. Não descansavam quando o corpo pedia
mas sim, quando a chuva irrompia e então havia que esperar que as condições do
tempo permitissem uma nova etapa.
Entre
os zombo, os colonos brancos
raramente se estabeleciam na condição de colono
da terra ou o célebre xicoronho, como
era conhecido o emigrante português no planalto da Huila. A título de curiosidade, quanto à corruptela de colono por xicoronho, a palavra é composta pelo
prefixo nsi ou xi que, mais uma vez, significa terra,
no sentido de país, e coronho, que,
como se torna claro, indica colono, designando assim o branco que trabalhava a terra.
Dos autores que conhecemos
e que se dedicaram ao assunto, optamos por nos debruçar atentamente sobre cinco
deles. Mantê-los-emos no nosso horizonte de memória, enquanto dissertarmos
sobre a colonização entre os Zombo. O primeiro é conhecido da generalidade dos
portugueses, foi Ministro do Ultramar, em época difícil da governação portuguesa nas colónias,
ou seja, por finais dos anos cinquenta e princípio dos anos sessenta do século
passado. Trata-se de Adriano Moreira sobre quem recaiu também a
responsabilidade da direcção do Instituto Superior de Ciências Sociais e Política
Ultramarina, sedeada em Lisboa, escola de onde saíram os diferentes escalões
dos responsáveis pela governação das colónias, embora fossem conhecidas ultimamente
por províncias ultramarinas. O
segundo autor trata-se de René Pélessier, o reputado investigador das questões
coloniais das potências colonizadoras europeias. A ele recorreremos com
frequência, pela actualidade das suas referências em relação à vida dos zombo, durante
o período colonial, com as suas obras “La Colonie du Minotaure” (1978)[1], “Le Naufrage des Caravelles” (1979)[2] e “Histórias das Campanhas de Angola, Resistências e Revoltas 1845/1941”[3]. Em terceiro lugar, referir-nos-emos a
João Baptista Nunes Pereira Neto, e sobre ele citamos René Pelíssier (1978:36) (
“Le meilleur spécialiste de la question
démontre qu’en vingt ans (1931-1951) l’Etat
se desintéressera a peu pré complètement de la colonisation dirigée…” acrescentando que a sua tese de doutoramento
‘Angola Meio Século de Integração’[4] nos tem
vindo a servir para perceber a importância da sua envolvência face ao nosso tema. Em quarto lugar apontamos
para Manuel Alfredo Morais Martins, por ser um investigador que trabalhou e
conheceu os zombo, durante a década de cinquenta do século passado pois ali
exerceu o cargo de Administrador na vila da
Damba, o que o levaria a escrever
a obra ‘Contacto de Culturas no Congo
Português’(1973)[5]. Finalmente,
o quinto autor é Arthur Ramos de Araújo Pereira, médico psiquiatra, psicólogo
social, indigenista, etnólogo, folklorista e antropólogo. O que mais nos
aproxima deste autor são as comparações que podemos estabelecer muito nitidamente,
com os kongo e por consequência, com os zombo, através de
três obras de sua autoria: O Negro
Brasileiro(1934)[6], O Folklore
Negro do Brasil (1935)[7] e
finalmente Estudos de Folk-Lore (1951)[8].
Pensamos não ser um pretensiosismo, apontarmos este escritor brasileiro, como
de leitura indispensável para discorrermos sobre o pensamento zombo,
especialmente pela relação temporal e pelo espírito Zeitgeist , ou seja, o "espírito da época" ou
"espírito dos tempos".
Retomemos
agora o título deste sub-capítulo: “A ‘Situação
Colonial ’ entre os Zombo.”. O seu significado é entendido segundo Adriano
Moreira (1966:23) “Como um complexo peculiar
de relações humanas sistematizadas tendo como fulcro um certo tipo de
dependência”. De seguida, desenvolveremos os mais variados aspectos da
questão, derivados da consulta de documentos históricos. Através da sua
leitura, foram-se enraizando, crescendo e desenvolvendo ideias sobre a
peculiaridade da colonização entre os zombo,
e continuando a citar sobre a questão, Adriano Moreira (1966:25), mais claro e
evidente se torna o nosso pensamento:
“ É que
a sociedade responsável pela constituição da situação colonial, quer no aspecto
do colonizador, quer no aspecto do colonizado, era inteiramente diferente, nas
suas características, da sociedade formada por aqueles que actualmente se
encontram envolvidos no fenómeno colonial. Bastará lembrar, como nota de
primeira evidência, que não tinham por essa altura, nem experiência de
colonizadores nem experiência de colonizados, e que não podiam sofrer nas
respectivas personalidades as pressões peculiares de uma vida em comum segundo
o esquema colonial que eles próprios estabeleceram”.
Um pouco mais à frente, Adriano Moreira (1966:30) acrescenta
para melhor esclarecimento:
“ (…) será então preferível, para os fins da ciência
política, substituir a noção de colónia pela noção de situação colonial e dizer
que esta se verifica sempre que no mesmo território habitem grupos étnicos de
civilização diferente, sendo em regra o poder político exercido só por um
deles, sob o signo da superioridade e acção modificadora de uma das
civilizações em contacto. Quando os órgãos do poder político têm sede em
território geogràficamente distinto, por acidente natural ou histórico, diz-se
que a situação colonial decorre numa colónia.”
Convirá
finalizar, por agora, o pensamento de Moreira (1966:37) para o enquadrar no
objecto de estudo da dissertação de Neto (que transcreveremos abaixo:
“ Pelo que toca ao destino da relação de dependência
colonial, pode o esquema colonial ser definido em função de uma final separação
entre o Estado colonizador e o povo colonizado, que vem a adquirir a independência;
ou pode acontecer que o fim procurado para a independência colonial seja a integração
numa unidade política, que pode revestir qualquer das formas clássicas de
Estado unitário ou federado, ou mesmo qualquer outra forma nova, como parece ser
o objectivo da União Francesa”
Na
posse deste esclarecimento, entenderemos então que a questão colonial não foi
‘uma linha recta’. Houve que agir operacionalmente conforme a conjuntura
política internacional se apresentava a dado momento, e sobretudo nunca
perdendo de vista os magros meios financeiros portugueses e o seu fraco excedente
demográfico disponível. Apesar de todos os esforços, houve sempre grande
cautela em gerir o recurso à força, com que, por vezes, a sociedade
colonizadora se viu obrigada a utilizar. Os zombo reagiriam à pressão a que
estavam condenados.
É por
isso, oportuna e sintomática a dissertação de João Pereira Neto. Será bom que
atentemos no título e na data da publicação, 1964, e daí podermos retirar
algumas e preciosas ilações, bastando substituir o termo usado diferença tecnológica por poder político. Voltaremos a esta
citação noutra ocasião (1964:19).
“O estrito cumprimento desses
princípios é condição essencial de sobrevivência para o grupo tecnologicamente
mais evoluído, se for demograficamente minoritário, porque se assim não
proceder, na altura em que for superada a diferença tecnológica a reacção do grupo até
então considerado inferior não só destruirá, na sua ânsia de superar o
condicionalismo em que se integra, tudo o que considere revelador da sua
condição de inferioridade, como inutilizará também tudo o que de bom houver
sido feito pelo outro grupo”.
Com o
respeito devido à autoridade do autor no tratamento deste assunto, gostaríamos
de lembrar aqui uma frase que ouvimos em 1975 a Jonas Malheiro Savimbi: “Quando os elefantes se zangam quem sofre é o
capim…”, na versão portuguesa: “Quando
o mar bate na rocha, quem se lixa é o mexilhão…”. Embora fosse essencial o
respeito pelas condições de vida do grupo tecnicamente menos evoluído, Neto estava muito atento e diga-se de passagem
que na dissertação não se referiu a questões que sabia serem cruciais para o seu objecto de estudo. Na
abordagem e referências face aos zombo, só Adriano Moreira parece não ter
referido em qualquer obra ou artigo os zombo. Ainda assim, que saibamos, só
Alfredo Morais Martins (1973:99) conheceu no terreno e bem os zombo, afirmando
o seguinte:
“Os
mercados em todo o Congo, abstraindo da referida evolução derivada de
alterações sofridas pelo comércio de exportação, tinham e têm características
especiais e dignas de nota, que devem vir de recuadas eras em que a instituição
se criou e se têm mantido quase incólumes até aos nossos dias, pelo menos nas
áreas onde se radicaram mais firmemente e que são, precisamente, as que melhor
conhecemos: Zombo e Damba”[9].
Para reforçar o título da nossa dissertação em kikongo, diz a respeito apoiando-se em J. Van Wing , autor da
obra Etudes Bakongo, Histoire et Sociologie, Bruxelas, (1921:107):
“ Na região de Mpangu que actualmente tem como centro
principal a importante povoação de Thysville, no Congo Belga, a influência dos
Bazombo era tanta, as visitas comerciais eram tão frequentes, que a Via Láctea,
por apresentar no firmamento a mesma direcção do principal caminho trilhado
pelas caravanas daqueles caminhantes infatigáveis, passou a ser conhecida por
Nzila Bazombo, isto é, caminho dos bazombo”.
Veremos
ainda que o nosso discurso fluirá como contribuição ao estudo das
características do povo zombo, e que, umas vezes, coincidirá com as opiniões do
autor citado e outras vezes rondará particularidades e factos históricos deste
povo de fronteira o que, até aqui, que saibamos, não foram abordadas em dissertações
académicas, nem dela demos conta em qualquer outro texto. Vamos realçar a
dinâmica da plasticidade dos zombo, face
à administração dos portugueses, veremos como souberam iniciar a nova adaptação
à prática do contrabando de sobrevivência. A adaptação à agricultura de tráfico
que as suas famílias, melhor as suas mulheres e filhas se viram compelidas a
aprender, equilibrando o que precisavam para a alimentação da família até à nova
colheita de outro alimento vegetal substituto, vendendo o restante nos nzandu (mercados), debaixo da tutela do
chefe de família, sendo certo que talvez fosse a partir daqui que começaram a
fazer o seu mealheiro e subtilmente fazerem o seu próprio mercado paralelo face
ao marido. Terá sido com este povo que os portugueses terão de se entender
nesta zona até 1975.
Fotografia nº Tripulação da lancha
Veríssimo (375) Fotografia de Veloso e Castro 1905.
Quatro
componentes da colonização portuguesa do norte de Angola, tornaram-se
relevantes para a importância do seu legado no futuro desenvolvimento dos zombo.
Estamos a referir-nos aos comerciantes do mato, em primeiro lugar, por serem os
intérpretes das trocas mercantis, e delas, muitas vezes, se aproveitaram
indevidamente não tendo o menor escrúpulo em enganar o indígena, que também não
era assim tão inocente, se nos lembrarmos da secular concorrência dos
mercadores islamizados na área. Seguidos dos militares, que se serviram das
informações dos comerciantes, para poderem progredir no terreno, porque foram
eles os principais intérpretes da ocupação efectiva, os que eram obrigados a pagar
muitas vezes com a vida, a missão de que estavam investidos, carregando com o
ónus do ódio ao branco.
Devemos
acrescentar que os valores morais pelos quais se pauta o militar e que são a ‘honra,
a vergonha e o dever’. Esses princípios trazem na sua essência os mais
elementares conceitos de justiça, sendo evidente que as grandes agruras
passadas em campanha também levam ao desleixo e, muitas vezes, ao rompimento
com os valores acima mencionados.
De
seguida, referimo-nos aos missionários que não necessitam de apresentação, dada
a sua presença por estas paragens desde a chegada de Diogo Cão (1483). À sua
acção dedicámos já uma parte substancial da primeira parte da dissertação
quando demos a nossa contribuição para os “Antecedentes
dos Zombo com o Reino do Kongo”, porém, devemos acrescentar que as relações
entre duas igrejas – a católica e a protestante e o Residente em S. Salvador do Kongo,
não foram nada fáceis – a partir de 1878, com o início das relações de George
Grenfell, primeiro director da Baptist Missionary Society, relatadas numa obra
extraordinária (da qual não demos fé nem nas Bibliotecas das Universidades Portuguesas
nem na Biblioteca da própria Sociedade de Geografia de Lisboa) que o autor
Harry Johnston (1908) intitulou ‘George
Grenfell and the Congo’[1].
Abaixo
reproduziremos uma célebre fotografia de George Grenfell em S. Salvador. No
nosso estudo, não estamos interessados em filiações religiosas, interessam-nos sim
as figuras e as obras destes dois homens excepcionais, por ordem de chegada a
S. Salvador: George Grenfell e o padre António Barroso.
Fotografia Nº George Grenfell em S. Salvador 1878 , da
obra George Grenfell and the Congo
A
nossa formação antropológica dedica particular atenção à Antropologia Visual, e
a fotografia acima sugere-nos dois reparos: Grenfell está apoiado numa carabina
e devidamente vestido para enfrentar os caminhos do mato. Perguntamo-nos como o
faria o padre António Barroso. Não é a nossa opinião que está em causa, mas sim
os factos e as relações consequentes das preocupações sociais dos missionários
para com os povos kongo da região. Iremos ao encontro da história com
documentos, e neste caso, embora saibamos das posições ideológicas tanto de
Heliodoro Faria Leal, como de Norton de Matos, lembremo-nos que um era
localmente o representante do governo e outro a autoridade máxima na altura em Angola. Comecemos
por dar a palavra ao primeiro, acerca do trabalho missionário, em geral, e depois,
em particular, acerca de António Barroso:
“ Ao chegarmos à
povoação vindos do caminho de Noqui, encontramos em primeiro lugar o cercado de
sebes vivas que separa do caminho os terrenos ocupados pelos missionários da
Baptist Missionary Society , com pavilhões de moradia de cada missionário, o
dispensário para o tratamento dos indígenas e a farmácia . Em frente, uma área
de terreno limpo aguarda a concessão pedida há mais de um ano para a edificação
do hospital em madeira, a que já nos referimos, cujos materiais o Governo da
metrópole dispensou de direitos, atendendo ao fim meritório a que visam, mas
que se vão perdendo pela acção do tempo e do salalé (formiga branca) devido às
dificuldades das, sempre variadas, leis de concessões de terrenos. Se
tornearmos o cercado das habitações dos missionários ingleses, dando-lhes a
direita, passamos a escola e o templo dos protestantes e logo avistamos os
pavilhões de madeira, da missão católica portuguesa e a igreja paroquial de
Nossa Senhora da Conceição. À vista uma da outra as igrejas, católica e
protestante, são as sentinelas isoladas e imóveis dos dois implacáveis campos religiosos,
que tem disputado palmo a palmo, mais do que as almas para Deus, adeptos para a
sua influência política e de raça, assentes nos arraiais sobre os alicerces de
vários conventos de frades![1]
[1] Leal, Heliodoro Faria (1914). Estudos
Coloniais-Memórias de África. Boletim da
Sociedade de Geographia de Lisboa. 10: 349
“Inteligente e activo o
padre Barroso lançou as bases da moderna propaganda religiosa católica e se não
levou de vencida os seus antagonistas protestantes sustentou, contudo,
briosamente a contenda e criou um forte núcleo de adeptos, no que teve como
auxiliares e seguidores os padres Sebastião José Pereira, Mathias, Gata,
Albuquerque e Pequito, jazendo este último no abandonado cemitério de S.
Salvador do Congo”[1]
Fotografia Nº
Da obra: Memórias e Trabalhos da Minha Vida III volume
pag.144
A última
componente, por ter sido a última a chegar, os administradores de circunscrição
e os sacrificados chefes de posto que viriam a substituir os capitães-mores,
note-se que dizemos sacrificados porque Portugal e a administração colonial portuguesa
nunca os recompensou devidamente, especialmente nos seus vencimentos e regalias
(só facultadas a administradores de circunscrição). Algumas vezes, foi-lhes
apontada brutalidade e injustiça no cumprimento dos seus deveres, que diga-se
em abono da verdade alguns mereceram, mas a maioria sabia, isolada como estava,
que impor pela força a autoridade era condição sine qua non para uma vida passada a ser odiado sem necessidade.
Aqui,
não se abordará a colonização dirigida porque pura e simplesmente não se
verificou nesta parte de Angola. Os
percursos, que os europeus faziam em caravana ou isolados, eram os mesmos que
os zombo percorriam há séculos.
Poucos fazem ideia do que era passar o terreno dos dembos, o calor
insuportável, o andar, ou melhor, o arrastar dos pés pelos areais do Libombo ao
Tabi e daqui por sua vez ao Ambriz. A falta de água potável, os lamaçais, o
corpo rasgado pelas espinheiras, o medo de ser mordido por uma serpente e,
acima de tudo, os mosquitos que com as suas constantes picadas não deixavam as
gentes em paz, tornavam-se as mais implacáveis dificuldades. Entre os
inconvenientes climáticos, havia a destacar a predominância de um tempo quente
e húmido, que fazia com que a roupa estivesse permanentemente colada ao corpo,
fazendo dos viajantes presas fáceis dos agentes infecciosos, como os insectos
vectores, os protozoários, os fungos, os vírus e bactérias. Alguns são
cosmopolitas, como os da lepra, tuberculose, febre tifóide e desinteria
amebiana, outros eram de origem exclusivamente africana como os da bilharziose,
das tripanosomíases e da febre-amarela. Sem dúvida, que esses europeus ‘compradores
de ilusões’ se encontravam em terrenos da maior concentração de doenças
malignas existentes nas terras africanas. Não admira que muitos desses
viajantes morressem logo após os primeiros meses da chegada.
Os brancos que nos
primórdios do século XX avançaram sobre o norte de Angola e mais
especificamente os que ocuparam a savana zombo e que precederam os militares ou
os seguiram, foram os comerciantes do mato
que substituíram os funantes e formaram
uma das componentes a que nos referimos nesta secção da dissertação.
[1] Idem, p. 353
A
relação directa que temos com o assunto prende-se com um longo período da nossa
vida: o da convivência com os zombo, no seu ‘chão’ de origem. Foram vinte e
cinco longos anos de aprendizagem ininterrupta com os zombo e que ocuparam parte da nossa juventude e da
nossa vida adulta. A esta relação dedicaremos parte do espaço da colonização
1945/1975. Pessoalmente, fizemos parte dessa faixa de portugueses que andaram de ‘mochila às costas’, o que
acontecia e ainda acontece, pelas mais variadas razões, como por exemplo:
A conquista, o
espírito de aventura, o rigor climático, a questão da fome, as perseguições
políticas e religiosas, a busca de terras mais generosas ou menos densamente
povoadas, a inquietação perante as crises económicas e os períodos de
desemprego, o desejo de melhoria de condições de vida, a simples curiosidade, a
renovação de horizontes, entre outros.[1]
Por nós, pensamos que se
deve acrescentar, pela parte que cabe às razões da necessidade de emigrar - a
pressão familiar, os conflitos dentro dela gerados e a fuga à justiça, por
prática de crimes da mais variada ordem, como factores preponderantes na
equação do problema da deslocação das classes menos privilegiadas para países
distantes.
Não trataremos aqui a
questão da Colonização Científica Portuguesa,
que tanto quanto sabemos, foi tradicionalmente empírica. Só em 1906, se fundou
a Escola Colonial, como instituição pedagógica e, em 1926, dela emergiu a
Escola Superior Colonial, também da responsabilidade da Sociedade de Geografia
de Lisboa e que viria mais tarde a dar lugar ao Instituto Superior de Ciências
Sociais e Política Ultramarina para finalizar no Instituto Superior de Ciências
Sociais e Políticas.
Apesar
deste extraordinário avanço, Angola e Moçambique continuaram a receber os
europeus disponíveis, sendo que a esmagadora maioria eram homens ‘arremessados’
ao território isoladamente, mal sabendo ler e escrever. Mesmo em 1963, no
decorrer de uma célebre operação de povoamento apressada e desfasada, o célebre
batalhão Ferreira da Costa, deparámo-nos
com uma situação idêntica. A recepção aos ditos ‘colonos’ era feita em
instalações adaptadas no bairro da Terra
Nova, em Luanda. Estavam lá albergados perto de trezentos colonos disponíveis,
nenhum tinha a antiga quarta classe e todos eram agricultores. Nenhum era
pedreiro, carpinteiro, serralheiro, pintor, enfermeiro, entre outras
especializações.
Os colonos do início da
ocupação, ao serem levados, muitas vezes, enganados por outros, para a terra
dos zombo beneficiaram da pacificação militar ou do seu início. Se alguma
sabedoria tinham, era só a da sua tradicional cultura popular da terra de
origem e mesmo essa componente da cultura, era na maioria das vezes a menos
louvável. Tratava-se da ‘cultura do desenrasca’, onde “na terra dos cegos quem
tem um olho é rei”. Cabe aqui referir que a administração colonial implantada
na zona, utilizava como bandeira, principal esta componente comercial, uma vez
que a sua futura maneira de estar como comerciante o fixaria à terra.
É verdade que o agente do
governo na zona, corria o risco do comerciante se aproveitar da pressão militar
exercida sobre o indígena, para o roubar descaradamente. A princípio, o indígena, pouca ou nenhuma atenção lhe merecia, só
entendia se era ou não difícil a aquisição dos produtos permutados, perceptível
pela maior ou menor colaboração dos nativos. Porém, a plasticidade social do
português, assimilador fácil de valores sociais, corrigia os seus defeitos com
a necessidade de se adaptar ao meio social o melhor possível, e neste caso os zombo.
Por isso, aqueles que vingavam dos martírios a que a terra os submetia, (salvo
os missionários por serem católicos), breve se fixavam à terra através da
ligação à mulher da terra. Na nossa opinião, esta ligação, em termos da
aceitação ou não, pelos homens da terra, não foi fácil, porque estavam
simplesmente habituados a mandar. As mulheres iriam para onde o chefe da
família extensa mandasse. Os novos elementos militares ou da administração
civil tinham aparentemente a vida mais facilitada pelo seu emergente papel de
senhores da terra. Permitiam-se em alguns casos, mais frequentes do que seria de
desejar, sujeitar as autoridades tradicionais ao silêncio e a anuição dos zombo
em geral não lhes interessava. Porém, nem tudo era tão linear como aqui se
possa deixar transparecer. Muitas vezes, a mulher nativa, muito nova, era
introduzida na administração com as instruções precisas dos mfumu a vata. Tornava-se imperativo que engravidasse.
[1] Barata, Óscar Soares (1965) Migrações e Povoamento. Edição da Sociedade de Geografia de Lisboa.
Lisboa: p.7.
Fotografia Nº de
Veloso e Castro 1912
De seguida, o administrativo
seria confrontado pelos seus superiores face à situação em que se tinha deixado
enredar, e aí, a mulher, com os filhos que conseguisse do branco, viria a ter
um papel relevante nos serviços a prestar à sua comunidade. O mesmo se passava
com o comerciante do mato. Neste caso, o processo era muito mais rápido. O seu
permanente contacto com a Vata e as
condições a que era obrigado a aceitar por parte do mfumu a vata a que se acrescentava a sua veia oportunista, caso
quisesse sobreviver, não lhe permitia outra escolha. Toda a família extensa
vinha comer do ‘barraco’ (a casa comercial de
pau a pique), todos os tios, sobrinhos, irmãos, todas as mães e pais
(leia-se mamã e tata). Seria possível
a este homem aguentar as teias do sistema? Acabava muitas vezes por perecer,
deixando como único rasto os filhos mestiços. A verdade é que conhecemos já
idosos, homens de sucesso, vindos deste lote de ‘compradores de ilusões’.
Fotografia Nº acervo de Veloso e Castro
A experiência dos contactos que tivemos desde a nossa infância
(1944) até 1975, dão-nos respostas diversas. A primeira e mais corrente, era a
que se verificava nos centros urbanos, o homem branco não assumia as suas
responsabilidades com a mulher negra, não respeitava os vínculos parentais em
que se tinha enredado. Normalmente fugia, denunciando a incapacidade de assumir
a paternidade, mudando de terra. Outros, alardeavam a sua indiferença de
‘condição superior’ e ignoravam os filhos pura e simplesmente. A mulher negra,
frequentemente pressionada pela sua parentela, descia à cidade e, de filho às costas,
vinha dizer àquele homem que o filho era dele, que Deus lho tinha dado. O
branco, por sua vez, alegava então que nunca a tinha visto e que ela o que
queria era comer de graça com toda a sua família. Podemos acrescentar que
perante este tipo de problema, o mundo não mudou de lá para cá.
A verdade é que hoje, em
Portugal, existem casos (não raros) de portugueses, que regressados em 1975 e
mesmo alguns anos depois, trouxeram as suas mães
pretas. Os filhos destas uniões estão hoje perfeitamente integrados no
continente e já constituíram família por cá. Quanto aos brancos, que
posteriormente se casaram em Angola com mulheres da terra, é assunto que
ultrapassa o âmbito desta dissertação. Os caminhos que traçou a integração, não foram certamente os que
os homens imaginaram, mas sim aqueles que a vida permitiu que acontecessem.
Este assunto naturalmente
não se esgota aqui. No capítulo seguinte, referir-nos-emos, com maior detalhe e
actualidade, à forma como a administração portuguesa viria a procurar
incentivar o processo colonial através da integração,
termo utilizado muito a propósito por Neto (1964:20) e a que viremos
debruçar-nos com a atenção que o assunto nos merece. [1]
Porém, os zombo que como
já vimos, têm um extraordinário apego à sua liberdade de movimentos, começando
pela forma como naturalmente pretendiam e pretendem gerir a sua escolha de
trabalho, que coincide com um arrogante desprezo por tarefas que sempre
consideraram servis. Curiosamente, viriam a ser reputados como excelentes alfaiates, lavadeiros e cozinheiros. Preferiram ser eles a
empregar-se tanto nas casas dos administradores coloniais, como em casa dos
fazendeiros ou comerciantes do mato. Admitimos
aqui, mais uma vez, que se apressavam a ficar com os trabalhos, não só menos cansativos
mas também escolher entre aqueles que lhes permitissem ter acesso à intimidade
da casa dos brancos. O trabalho da agricultura e venda nos mercados foi sempre da
responsabilidade das mulheres. Estas ocupações também lhes deixavam margem para
se dedicarem à caça e às célebres fundações
(aquilo a que podemos comparar com as nossas sessões parlamentares) e, a
partir de agora, ao pequeno comércio de sobrevivência – o contrabando. A sua integração também se ia fazendo pelo lado que
circunstancialmente mais lhes interessava.
Contudo, há que notar
que, de uma forma geral, tanto a população negra como a branca se sujeitava
facilmente (talvez até por raízes culturais) à situação de profunda submissão,
não discutindo nunca, independentemente da razão, o trabalho que lhes era
atribuído.
Assim, o que deixamos
dito é suficiente para se compreenderem os esforços dos mfumu a nsi, mfumu a vata,
como líderes das populações zombo, em
geral localizados nas proximidades da fronteira zombo, muxikongo e yaka, para extraírem o máximo de proveito da
presença das autoridades portuguesas e belgas. À primeira vista, o que acabamos
de dizer parece um paradoxo, porém os zombo
gozavam da maior liberdade em relação às autoridades estabelecidas, uma vez que
estas não conheciam as nzila que
levavam directamente a qualquer dos lados da fronteira, tendo em vista o novo intercâmbio
comercial dos novos bens em circulação.
Nestas circunstâncias,
não surpreende que o controlo (em bens e pessoas) das nzila constituísse a maior preocupação das autoridades portuguesas
e belgas. Por esta razão, se pode explicar a constante emergência de novas vata, grandes e pequenas, cujas zonas de
influência viriam mais tarde a assumir notáveis tentáculos sociopolíticos.
Foram-se estendendo, ao longo de toda a fronteira, o que viria a permitir o
ressurgimento do velho pensamento da reunificação do antigo reino do Kongo.
Desta estratégia, nasceu o que se tornaria provavelmente o maior problema da
administração portuguesa de Angola, nesta zona, o ressurgimento dos movimentos
mágicos e proféticos kongo, raiz de onde viria a emergir o tocoísmo, ao qual
dedicaremos a devida atenção na parte final da colonização (1940/1975).
[1] Pélissier, René (1978) La
Colonie du
Minotaure, Nationalismes et révoltes en Angola, Edições Pelissier, Montamets,. France
[2] Idem, (1979) Le Naufrage des Caravelles, Études sur le Fin de L’Empire Portugais
(1961-1975) Editions Pelissier, Montamets. France
[3] Idem,
(1986) História das Campanhas de Angola,
Resistência e Revoltas (1845/1941). Editorial Estampa, Lisboa
[4] Pereira Neto, João Baptista Nunes (1964). Angola Meio Século de Integração. Tese
de Doutoramento. Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina.
Lisboa. 332 pp.
[5] Martins, Manuel Alfredo Morais (1973) Contacto de
Culturas no Congo Português. Separata da
Revista Estudos Políticos e Sociais. Instituto Superior de Ciências Sociais
e Política Ultramarina. Lisboa
[6]
Ramos, Arthur Ramos de Araújo Pereira, O
Negro Brasileiro, Civilização Brasileira S.A., Rio de Janeiro, 1934
[7] Idem
(1935) O Folklore Negro do Brasil.
Livraria da Casa do Estudante do Brasil. Rio de Janeiro
[8] Idem (1951)
Estudos de Folk-Lore. Livraria Casa
do estudante do Brasil. Rio de Janeiro
[9] Martins,
Manuel Alfredo Morais (1973) Contacto de Culturas no Congo Português. Separata da Revista Estudos Políticos e
Sociais. Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina. Lisboa
[1] Presumimos que o acontecimento retratado teve lugar em
1 de Julho de 1911. Dizemos isto, pela descrição dos acontecimentos que o
Residente Faria Leal reporta durante a eleição de Manuel Martins Kidito a que
nos referimos quando abordamos esta questão.
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